Duas reflexões são bastante comuns no início de ano: como posso ter mais felicidade em minha vida pessoal? Como posso alcançar mais resultados na minha vida profissional?
Nós da Carpegiani Associados acreditamos que a resposta para essa e outras questões está no coletivo.
É fundamental que cuidemos de nós mesmos e de tudo aquilo que é importante em nossa vida. Mas só vamos realmente conseguir o que desejamos se formos capazes de olhar para o outro, cultivar bons relacionamentos e construir o futuro a partir disso.
Neste primeiro artigo escrito para a Carpegiani Associados em 2021, convidei os colegas Anubis Rezende e Matilde Berna para uma criação coletiva, em que cada um de nós lança seu olhar sobre um mesmo tema: com que lentes você tem olhado a realidade?
Convido vocês à leitura e, especialmente, à reflexão!
NÃO TRATE OS OUTROS COMO QUER SER TRATADO
Não, você não leu errado. Parece que o título está incorreto, não é mesmo?! Afinal, crescemos ouvindo a frase “trate os outros como quer ser tratado”. Mas é sobre isso mesmo que quero conversar com você hoje.
Qual o impacto da avaliação das necessidades, suas e de seus interlocutores, nos seus relacionamentos interpessoais?
Tratar os outros como queremos ser tratados pressupõe que absolutamente todas as pessoas do universo pensam e sentem exatamente como nós. Isso faz cair por terra duas das mais importantes conquistas das ciências humanas: a individualidade e a diversidade.
Ao tratarmos todas as criaturas de uma maneira única, padrão, uniforme, corremos o risco de frustrar aqueles que queremos acolher.
Se suas análises partem apenas da sua visão de mundo, daquilo que você acredita ser o melhor, você desconsidera a realidade do outro, seu contexto, suas necessidades e sua ética para formulação de decisões.
A neutralidade como aliada
Acredito que o coach – ou a psicanalista, no meu caso – deve estar totalmente a serviço do seu cliente, pensando no seu bem-estar. Neste momento, não importam meus valores ou necessidades; meus julgamentos e as premissas pessoais que uso para chegar até eles.
Meu trabalho é provocar reflexões sobre uma situação específica, ajudando na linha de condução desta.
Da mesma forma, mesmo não tendo esse aspecto como principal ferramenta de atuação profissional, todos nós devemos ser capazes de olhar para outro ser humano e compreendê-lo.
Devemos usar nossa curiosidade para genuinamente buscar saber o que é importante para ele, e o mais importante: tratá-lo como ele quer ser tratado!
Artigo escrito por Denise Carpegiani
O PODER DA CURIOSIDADE
por Matilde Berna
Ao começar a ler o artigo da Denise “Não trate os outros como quer ser tratado”, tive mesmo a impressão de que algo estava errado. Mas, claro que não! Sua abordagem clara e direta não me deixa dúvidas da importância de olharmos profundamente o outro para entendermos o que é importante para ele.
Mesmo assim, me peguei intrigada… Por que ainda usamos esta expressão em alguns dos nossos diálogos? Começo então a prestar mais atenção em quem está à minha volta e percebo que muitas vezes a expressão é coloquial e trata de uma situação bem especifica.
Recentemente, atendendo um cliente executivo, ouvi a seguinte frase: “Ontem tive uma conversa muito dura com um dos meus diretos que desrespeitou um de seus funcionários, e eu disse a ele que tratasse os outros como gostaria de ser tratado”. Esta frase, colocada neste contexto, me parece ter um significado diferente, como um chamado para um olhar aprofundado sobre o outro, com mais respeito.
Mergulhando no tema, também me deparo com as verdades científicas que Anubis traz em sua contribuição, quando nos mostra a perspectiva sobre a Ótica e a Psicologia. Isto nos faz perceber clara e cientificamente que as pessoas são muito diferentes e, portanto, não veem o mundo e as coisas sob a mesma ótica. Claro, temos necessidades, interesses, motivações e valores diferentes que acabam norteando comportamento, escolhas e decisões.
Quando damos espaço para o que o outro deseja, tiramos o foco do julgamento, tão presente em nossa comunicação.
Segundo Douglas Stone, professor de Harvard e especialista em comunicação, escutar o outro não é uma coisa fácil, por isso precisa ser exercitada – “É preciso transformar nossa voz crítica em curiosidade”.
Faça mais perguntas e julgue menos. Desta forma é possível entender o que é importante para o outro, tratando-o como ele quer ser tratado.
O OUTRO NÃO SOU EU
por Anubis Rezende
O que torna mais difícil para qualquer pessoa entender a outra não é a falta de empatia ou compaixão, o egocentrismo ou qualquer outra incapacidade.
Eu quero deixar uma perspectiva que contribua para essa discussão a partir de outros ângulos.
Acompanhe minha visita à algumas ciências, bem diferentes, mas que podem lançar luz, por similaridade, em nossa conversa.
Comecemos com a ótica.
Você deve se lembrar de um desafio que quebrou as redes sociais há um tempo: a cor do vestido. Era prioritário definir a verdade.
Pesquisas científicas mostraram que no Brasil a maioria checada enxergava as cores preto e azul. Aí, estudando as células responsáveis pela percepção de cor (cones), especificamente o cone S (cianopigmento) descobriram que há variações entre as diferentes percepções. Isso equivale a três controles avançados nas TVs digitais: saturação, matiz e temperatura (frio, padrão e quente). Referem-se à quantidade de cor e sua tonalidade. Esses três tipos de cones cobrem o espectro do comprimento das ondas de luz. Atrás da menina de nossos olhos existem ainda os Bastonetes, que nas TVs equivalem a luz de fundo, brilho e contraste. Captam a luminosidade. Por isso tem gente que enxerga melhor ou pior no escuro.
Conclusão: vemos as cores conforme nossa genética e a luminosidade presente no ambiente. No Brasil ensolarado desenvolvemos essa “mirada” de cor.
Vamos para outra ciência: a Psicologia. Mais especificamente a Psicanálise. Freud e outros vários estudiosos, como Lacan, deram muito valor à palavra e sua interpretação. Assim nos levaram a compreender porque falar sobre algo que nos incomoda emocionalmente muitas vezes ajuda.
Historicamente, essa já era a base do conceito de se confessar aos padres. Você tirava o pecado de dentro de si, recebia sua penitência e voltava novinho, limpo e pronto para novos pecados. Pois bem, segundo nossos amigos psicanalistas Melanie Klein e Winnicott, desde bebês desenvolvemos estruturas que funcionam como uma espécie de polícia interna para decidir o que pensar e o que fazer. Por isso, às vezes, temos vontade de dar um tapa num adulto que nos dê uma bronca no trânsito, por exemplo. Porém nossos guardinhas mentais de plantão entram em ação e nos fazem engolir nossa raiva. Em 1 décimo de segundo nos avisam que também podemos sofrer danos físicos. Ou nos lembram que:
- Isso não é um comportamento de pessoa civilizada
- Não vai resolver nada que já houve
- Você não é juiz do mundo
- Você não deve se rebaixar ao comportamento errado de outra pessoa
- Isso é só uma reação de vingança e alimenta seu ódio
- Ou até mesmo, em última instância, que você deve ir lá e dar o tapa para aliviar sua raiva
Resumo da ópera: se a gente não controla 100% dos nossos pensamentos e nem enxerga as cores exatamente como as outras pessoas, como é possível querer que alguém faça o que você costuma fazer e entenda algo como você entende? Afinal, isso seria considerar que todas as pessoas são exatamente iguais. Mas tá na cara que não somos. A cultura de cada família, região ou a história de vida de uma pessoa podem tê-la feito desenvolver uma visão (Ótica) ou guardinhas internos (Psicologia) diferentes dos seus.
Mas você não precisa acreditar em mim. Quer fazer o teste? Junte algumas pessoas com quem você tenha uma ótima amizade, defina qual é a cor do vestido e explique, para uma pessoa que vê uma cor diferente da sua, que ela está completamente errada. Porém, tenha certeza da amizade desta pessoa ou poderá nunca mais reencontrá-la na vida.
Se todos fossem iguais a você, poderia ser meio chato viver. Parece mais fácil. Mas se alguém discordasse um dia, teria que ser expulso do mundo. E isso tem um nome. Tirania.